SIMONE DUARTE
Foi um dos militares norte-americanos mais destacados das últimas décadas e durante muito tempo um potencial candidato à presidência. Republicano, votou no democrata Obama e está impressionado com ele. Aos 72 anos, diz que já não tem ambições políticas.
Foi o negro americano que mais poder teve antes do Presidente Barack Obama. Aos 72 anos, Colin Powell costuma dizer que é ex-tudo: conselheiro para a Segurança Nacional no Governo de Ronald Reagan, chefe do Estado-Maior, mais alto posto militar do país, de George Bush e Bill Clinton, secretário de Estado no primeiro mandato de George W. Bush. Planeou a invasão americana ao Panamá em 1989 e comandou a Operação Tempestade no Deserto durante a Guerra do Golfo em 1991.
Em 1995, a sua popularidade era tal que chegou a ser indicado pelo partido republicano para a presidência, mas preferiu não concorrer. A sua reputação parecia irrepreensível até ao fatídico discurso no Conselho de Segurança da ONU, em 2003, quando, ao segurar um tubo de ensaio, afirmou e "mostrou as provas" de que Saddam Hussein tinha armas químicas para justificar a posterior invasão ao Iraque. Nunca se encontrou o arsenal iraquiano. O que se descobriu foram as falhas dos serviços secretos norte-americanos.
Para muitos, o discurso foi uma mancha na reputação de Colin Powell. Para outros, o então secretário de Estado foi vítima das armadilhas do vice-presidente Dick Cheney e do secretário da Defesa Donald Rumsfeld e o único que não queria a guerra.
Desde a saída do Governo, no fim do primeiro mandato de George W. Bush, que Powell evita os jornalistas. Raras vezes o republicano quebra o silêncio. Uma delas foi em Outubro de 2008, ao declarar o apoio e o voto ao democrata Barack Obama. Ou ainda em Maio, quando afirmou que o Partido Republicano tem de passar por uma grande reforma. No mês passado, na suíte presidencial 816 do luxuoso hotel Rittenhouse, na Filadélfia, horas antes de falar para jovens líderes de mais de 20 países do Programa de intercâmbio EEF (criado pelo ex-presidente e comandante das forças aliadas na Segunda Guerra Mundial, Dwight D. Eisenhower, um dos ídolos do general Powell), o antigo chefe da diplomacia americana falou um pouco de tudo.
Para si, que esteve no centro dos principais acontecimentos internacionais das últimas décadas, qual é o papel que os Estados Unidos podem exercer neste novo mundo, tão diferente do pós-guerra fria dos anos 90, quando era a única superpotência. Agora que há um mundo dito "multipolar", com China, Rússia e outros actores no cenário internacional, que papel está reservado para os EUA?
Eu ainda acho que vai ter um papel de liderança. Mas o termo "superpotência" já não se aplica. Eu não gosto das palavras "bipolar" ou "multipolar", soam a problemas psicológicos [risos]. Estamos a assistir ao surgimento de vários centros emergentes de poder. A União Europeia é um centro de poder. Na Ásia, a China e o Japão são centros de poder. Índia, Brasil, África do Sul. Existem hoje vários centros de poder. Há riqueza em diversas partes do mundo. Há pessoas com muita influência em diferentes lugares do mundo e os Estados Unidos têm de ter isso em consideração. Então, o termo "superpotência" ou, como os meus amigos franceses dizem, "hiperpuissance", deixou de fazer sentido.
Nós somos os líderes de uma coligação de nações. Não me refiro a líderes como numa aliança. Mas todos nós agora temos sistemas mais democráticos. A Rússia não é uma verdadeira democracia, nem a China, mas são cada vez mais democracias económicas. A China é uma democracia económica mais do que qualquer país, mas com um sistema político autoritário. Então o que vejo são países cada vez mais ricos com uma nova classe média a emergir, o que não existia há 30 anos. Você vê isso acontecer na Europa Central e no Leste europeu. Mas os Estados Unidos continuam a ser o país para onde se olha em busca de uma referência, o país que se acompanha atentamente e com o qual se mantém uma política alinhada.
Como posso provar isso? A China e os Estados Unidos têm uma relação económica muito estreita, em que eles estão a financiar o nosso défice. Quem poderia imaginar ao olhar para a história económica mundial que um dos países menos desenvolvidos iria financiar uma das nações mais ricas do mundo? Quem é mais poderoso ou menos poderoso? O ponto é que colaboramos. Rússia e a Europa Ocidental, ou ainda a Rússia e os Estados Unidos têm hoje uma relação completamente diferente da que tinham quando eu estava a crescer. Agora, a Rússia é responsável por fornecer energia para a Europa. É uma relação diferente.
Nunca imaginei que iria viver para ver países na América Latina com um desenvolvimento económico em níveis tão sofisticados, como vemos agora no Brasil. O Brasil é hoje um actor importante no cenário económico mundial. Vemos o mesmo a acontecer lentamente em África. Olhe para a Índia, 1300 milhões de pessoas. A Índia estava aliada ao bloco soviético, hoje tem uma parceria estratégica com os Estados Unidos. Então temos hoje no mundo diferentes áreas de poder: militar, económico, cultural, crianças em todo o mundo usam o Twitter. Os Estados Unidos ainda vão ter uma posição de liderança, mas não como superpotência.
Como desenvolver uma relação apropriada com uma China mais provocadora, assertiva, poderosa, uma China que compra petróleo do Sudão, gás natural da Birmânia, que diz que negócios são negócios, política à parte?
Nos meus quatro anos como secretário de Estado, nós tivemos problemas, mas resolvemos os problemas. Sempre percebemos que temos mais pontos em comum do que diferenças. Mas há uma diferença no modo como a China vê o resto do mundo e como nós e a maioria dos países do Ocidente encaram o mundo. Nós acreditamos que o sistema político democrático é o melhor. Acreditamos que temos de ajudar os países a livrar-se da corrupção, a desenvolver um sistema judiciário, acabar com a pobreza, ajudar na luta contra o HIV-Sida e outros problemas. A China tem uma visão diferente.
A China acredita que é o centro do mundo, o O Império do Meio. E usa os seus investimentos no estrangeiro em seu próprio interesse, mais do que no interesse do país em questão. Então, se a China está no Sudão, é para garantir o petróleo e não para melhorar a vida dos sudaneses; no Irão, é para garantir minerais ou ainda petróleo e não para levar o Irão para o caminho da democracia. Os chineses dirão: "É problema deles."
É diferente da visão norte-americana e da Europa ocidental, que crêem que nós temos de ajudar estes países a melhorar suas condições de vida. Mas a China vai a um destes países e pergunta: "O que quer ver construído?" Pode escolher se quer um hospital, escolas, um estádio de futebol ou um palácio presidencial. E se os governantes quiserem um palácio vão ter o palácio. Ainda que esta não seja a melhor opção para o país. Se isso é o que os governantes querem, a China faz.
Em contrapartida os EUA ou a União Europeia diriam: "Vocês realmente precisam é de estradas, escolas ou hospitais." Então há uma abordagem diferente aqui. O que temos de fazer é trabalhar muito próximo dos chineses para lhes mostrar que eles devem abordar estes assuntos de uma maneira diferente. Mas a China é um país grande, um país importante ao qual não se pode impor regras. Os dias de impor as regras a países com riqueza e influência acabaram. Temos de lidar com a China com cautela, temos de reconhecer os seus interesses e as suas preocupações e trabalhar com eles. Da minha experiência, concluo que isso pode ser feito mesmo tendo a China um sistema autoritário e não uma democracia.
A China de hoje é muito diferente da China que visitei, pela primeira vez, há 37 anos, quando era tenente e quando todos andavam vestidos de uniforme a bradar os livros vermelhos de Mao nas mãos. Esses dias acabaram. A China é um país bastante mais liberal. Então, temos de ter paciência porque os chineses são pacientes. Acredito que vão mudar quando perceberem que isso é o melhor para eles. Então, eu continuaria a sentar-me com eles para conversar sobre liberdade religiosa, sobre a relação com o Dalai Lama, com a Igreja Católica, você pode pressionar mas não pode pensar que pode impor.
E os parceiros transatlânticos neste novo mundo mais transpacífico? Acredita que os Estados Unidos podem resolver as principais questões internacionais dos próximos anos sem uma relação forte com a Europa?
Bem, existem duas grandes organizações transatlânticas: a NATO e a União Europeia. Sou membro da NATO desde os 21 anos de idade, quando era um jovem tenente. E para minha grande surpresa, como para a grande surpresa dos meus amigos russos quando a guerra fria acabou, em 1991/1992, e o Pacto de Varsóvia desapareceu, os meus amigos generais russos diziam: "Ok Colin, agora a NATO acaba, certo?" E eu: "Por que dizem isso?" E eles respondiam: "Como o Pacto acabou, vocês já não precisam dela, pois a NATO foi criada justamente por causa do Pacto de Varsóvia." E eu dizia: "Mas o problema é que os países continuam a querer fazer parte dela. Como se fecha um clube quando as pessoas estão a bater à porta querendo entrar e continuam a pedir para fazer parte dele?" Então, desde o fim da guerra fria, a NATO passou de 16 a 26 membros. Como explicar?
As nações europeias que permitiram a Cortina de Ferro queriam a sua segurança garantida e a melhor maneira de conseguir isso era entrar para a NATO. E, quando se entra para a NATO, além de amigos europeus também se tem os Estados Unidos e o Canadá. Então, a NATO continua a ter um propósito, ela expandiu sua visão, agora está no Afeganistão, nos Balcãs, está a agir fora da sua área, como dizemos. Agora isso parece normal, mas nos anos 90 era muito controverso. Era muito difícil imaginar o exército alemão ir para algum lugar fora das fronteiras alemãs, hoje ele está nessas regiões. A NATO continua a ser a maior organização para segurança na região transatlântica.
Quanto à União Europeia, nós não somos membros, mas acompanhamos com muito interesse esta integração. E muitas vezes digo nas minhas palestras que, quando olho para a Europa e vejo uma moeda única em quase todo o território, penso em como foram realmente capazes de desistir do franco e de outras moedas nacionais, que significavam tanto, para ter uma moeda única. É extraordinário. E o visto Schengen, um único visto que permite viajar por toda a Europa. Por estes dias, o ex-presidente polaco Kwaniewski foi visitar-me e contou-me que nas férias tinha ido de carro com a família de Varsóvia para o Sul da Europa e que a cada fronteira parava à espera de um guarda, mas já não havia guardas, era só seguir em frente, e ele não conseguia acreditar... Então, nós encontramos maneiras de trabalharmos juntos, a União Europeia e a NATO. Eu sinto... tudo isso sugere que ainda há uma atracção poderosa entre a Europa e a América do Norte (Canadá e Estados Unidos).
Mas quando se pensa na primeira visita do Presidente Obama à Europa, apesar dos muitos sorrisos, os europeus não parecem dispostos a pagar o preço desta aliança com a vida de soldados no Afeganistão...
Mas eles estão no Afeganistão, milhares deles, não, não vá por esse caminho... Eles estão lá, franceses, alemães, muitos países estão no Afeganistão. O problema é que eles não estão em número suficiente. Gostaríamos que eles enviassem mais soldados, mas quando se pensa em alianças, e o que muda quando os Estados Unidos não estão sozinhos no topo, é que cada primeiro-ministro ou Presidente tem os seus problemas políticos. Por isso, numa democracia, tem de convencer o seu povo que isso deve ser feito. E até agora eles não têm sido capazes de angariar apoio político para que os países da NATO mandem mais tropas para o Afeganistão. No caso do Iraque, enviaram poucos soldados de poucos países, pois não tinham apoio político interno. Não aprovaram o que nós estávamos a fazer. Então, não tinham como apoiar-nos da forma que queríamos. Este é o reflexo do mundo em mudança que vivemos hoje.
Então acredita que os Estados Unidos ainda precisam de manter uma forte relação com a Europa para enfrentar a maioria dos assuntos internacionais?
Absolutamente. Para lidar com todos os aspectos mundiais. Não há região do mundo em que a Europa ou os Estados Unidos não tenham um interesse. Nós temos interesses mútuos no Médio Oriente, em melhorar as condições em África, estamos conectados com todos estes países, agora, economicamente, através da Internet, do poder da TV, das viagens aéreas, das "viagens" via chat. E todos os países da Europa têm interesse no Pacifico, de uma maneira ou de outra, todos vão para a China para ver que negócios podem ser feitos. A Índia está a emergir como outra potência económica no cenário internacional. Quando olho para os países da Europa Central e do Leste europeu, todos querem BMW, mais empregos, já ninguém se pode isolar. Os únicos países que continuam a pensar que podem são o Irão e a Coreia do Norte.
Eu estive lá.
Eu não. Estive na fronteira. Como pode isso acontecer? É outro mundo. Os iranianos também acham que se podem isolar, mas os seus filhos tem uma visão diferente.
Acredita que a crise económica e financeira que vivemos hoje pode aumentar os conflitos armados em escala global? Afinal, os dois grandes conflitos mundiais foram antecedidos por grandes crises, depressões.
É uma crise difícil. Ainda está a assombrar muitas pessoas nos Estados Unidos e em todo o mundo. Está a afectar mercados em todo o mundo. Começo a ver uma recuperação no sector financeiro, mas ainda vai demorar na ajuda às pessoas que foram atingidas pela crise, que têm dívidas de hipoteca imobiliária, dívidas de cartão de crédito e que perderam o emprego. Mas não vejo nada comparável aos dias da República de Weimar, como o colapso, hiper-inflação e isso porque desenvolvemos mecanismos, sistemas para corrigir as imperfeições. Ainda que de vez em quando os sistemas falhem, como o que aconteceu nos Estados Unidos no ano passado, há mecanismos de correcção. Então você vê o Presidente Obama a injectar mil milhões de dólares no sistema financeiro, você vê Gordon Brown e Angela Merkel a fazer o mesmo. Penso que existe compreensão, coordenação e transparência suficientes para impedir que aconteça um colapso como a sua pergunta sugere. Não quero subestimar a agonia que a crise financeira está a provocar, mas quem gostaria de uma guerra, uma guerra contra o quê? Nada sugere que haja outro Hitler a caminho.
E quais são as prioridades da política externa dos Estados Unidos?
Diria que a prioridade número um é a crise do sistema financeiro internacional. Nós provocámos esta crise, essencialmente, com a nossa bolha imobiliária, com o problema do crédito imobiliário e espalhámos a crise pelo mundo fora. Então o mundo está a olhar para os Estados Unidos, não olha para a França ou para a Alemanha ou outro país, mas para nós, para que comecemos a estabilizar o sistema e o façamos voltar a movimentar-se. Nós ainda somos o motor que impulsiona o sistema económico internacional. Então acredito que esta é a prioridade número um dos Estados Unidos, do Presidente Obama. A seguir, ele tem de se focar no Afeganistão e Paquistão. Tem de se olhar para os dois ao mesmo tempo. Este é um problema sobre o qual ele disse que iria fazer algo. Em terceiro, há vários, como o programa nuclear iraniano, que tem relação directa com o Médio Oriente e com as preocupações de Israel. Há também o programa nuclear da Coreia do Norte. Mais cedo ou mais tarde, ele vai ter de descobrir quanto os norte-coreanos vão ter de receber para se livrarem das armas. É a única coisa que têm, ninguém prestaria atenção à Coreia do Norte se eles não tivessem um programa nuclear. Portanto, eles não vão deitar fora assim barato, pois é a única moeda, o único produto que têm. Você esteve lá. Na minha opinião, não estou a falar pelo Presidente Obama, as prioridades são a crise financeira internacional, Afeganistão, Paquistão e Iraque também está aí... o que vamos ver no Iraque é a redução significativa de tropas, mas vai ser dos iraquianos a decisão de determinar como querem seguir em frente.
Como pode o Presidente Obama manter o equilíbrio e o foco numa política internacional de longo prazo quando a política interna é cheia de lobbies, ele já começa a pensar na reeleição, na eleição de um congresso democrata para 2010. Veja o que aconteceu com a questão de Guantánamo no Senado. É possível manter uma estratégia internacional a longo prazo com esta dinâmica doméstica?
Claro que é. Você acaba de descrever a beleza de um sistema democrático. Não somos uma ditadura, não se pode dizer: "É isto que eu quero fazer." Existe um congresso, opositores políticos, há outras pessoas que querem ser Presidente e muitas que querem ser eleitas para o Congresso. E você tem aliados e inimigos. Todos os Presidentes com quem trabalhei (Ronald Reagan, George Bush, Bill Clinton, George W. Bush), e trabalhei para eles em cargos bem elevados, tiveram de equilibrar estes interesses em conflito. E reflectir constantemente sobre o que é que o povo quer. Estou impressionado com o Presidente Obama. Ele é muito calmo, muito coerente, ouve muitas pessoas, os assessores, os parceiros internacionais, e até agora o povo americano vê-o como uma pessoa que pode manter este senso estratégico sobre para onde nos encaminhamos, ainda que tenha de lidar com todos estes interesses divergentes.
Numa semana, o assunto é Guantánamo, os interrogatórios, na semana seguinte será outro tema. A questão de Guantánamo é essencialmente: como fechamos a base e para onde mandamos estas pessoas e como nos protegemos. O Presidente Bush repetidamente disse que queria fechar Guantánamo. Eu defendi e pedi o encerramento durante anos. E o Presidente Obama disse que vai fechar, que precisa de um ano para o fazer. Bem, ele tem de dar ao nosso Congresso um plano, porque eles não estão dispostos a dar-lhe o dinheiro enquanto ele não o mostrar. E vai haver um debate sobre isso. Daqui a pouco, começam os discursos do Presidente Obama e os do republicano, senhor Cheney, a criticar o Presidente Obama. Mas isso é democracia.
Como avalia o eleitor Colin Powell o governo Obama até agora?
Acho que ele teve um começo espectacularmente bom, mas acho artificial esta história de 100 dias, 101 dias... Queriam que eu participasse num painel na semana que vem para falar dos seis meses do governo Obama que é em Julho... Eu disse não, esta é uma invenção dos media. Ele só começou há quatro meses, já fez muitas coisas, tem muitos problemas para resolver, vamos esperar para ver. A única nota, grau, que conta no nosso país é se ele for reeleito daqui a quatro anos. Eu não participo neste A, B, C ou D...
Mas o eleitor Powell está satisfeito com o Presidente Obama?
O povo americano parece satisfeito com o trabalho que ele vem realizando. E, como parte do povo americano, estou satisfeito. Não estou satisfeito com tudo. Há situações, assuntos, que converso com ele. Quando tenho uma visão diferente, digo-lhe e ele ouve-me. O Presidente escuta muitas pessoas. Mas até agora conseguiu manter o apoio do povo americano. E é isso que conta.
Disse uma vez que é um ex-tudo, ao referir-se a todos os cargos que ocupou em diferentes governos...
[Sorriso] Sou um reformado.
Pela segunda vez?
[Powell dá uma gargalhada] Para sempre.
Para sempre mesmo?
Estou muito feliz com a minha vida particular e já estou velho [72 anos].
Então não pensa em voltar à política?
Setenta e dois... isso é velho [sorri]. Estou contente com a minha vida e não estou à procura de nenhum cargo político ou emprego.
Então como é um dia na vida do Colin Powell, agora reformado? Ainda acorda às 5h45 da manhã todos os dias?
Não. Já não me levanto às 5h45, como fiz durante 40 anos. Em geral, levanto-me quando acordo, a menos que tenha de acordar mais cedo para dar entrevista a algum jornalista [mais uma gargalhada]. Agora costumo acordar às 6 da manhã... [risos]. Quinze minutos são quinze minutos! Já não ando a correr porta afora, só se tiver uma viagem ou um discurso para fazer noutra cidade. Tomo o meu café enquanto leio seis jornais. Todas as manhãs. Todos em inglês, já que não leio outra língua. Vejo um pouco de TV, não muita. E vou para o computador e para a Internet. É de onde retiro a maior parte da informação e como me comunico com o meu escritório.
Se não estiver em viagem, fico em casa a maior parte do tempo a escrever discursos, a ler, a responder a perguntas. Tenho tantos pedidos [o escritório do general Colin Powell recebe por semana centenas de pedidos e convites para eventos, palestras...]. Posso ficar 14 horas assim. Os meus dias são cheios. Tenho alguns negócios. Uma parceria na área tecnológica em Silicon Valley. Tenho um centro em meu nome no City College em Nova Iorque. Estou envolvido em vários projectos na área de educação, a minha mulher faz muito trabalho de caridade. Mas é diferente de ter de estar todos os dias no mesmo lugar das 7 da manhã até às 8 da noite. Isso eu não faço mais. Ok?
[Olha para o relógio e percebe que a entrevista prevista para durar 15 minutos já dura 30]
Você enganou-me! [Powell dá uma gargalhada enquanto aponta para o relógio]
E esquecemo-nos de falar da Turquia, é a favor da entrada da Turquia na União Europeia?
[Já a levantar-se] Sim.
Por que resistem tanto os europeus em aceitá-los?
Você está na Europa, pergunte-lhes e descubra... [risos]. Segundo os meus amigos da Europa Ocidental, existem algumas dificuldades associadas à entrada da Turquia. Eles não estão completamente satisfeitos por a Turquia ser um país asiático e europeu ao mesmo tempo. É certo que é um país secular. Mas há algum receio de que, sendo a Turquia um país grande, a sua entrada venha alterar o equilíbrio actual.